Bio
Marcos nasceu em Jequié – BA, em 1957, é graduado em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Bahia, 1982. Possui curso de Especialização em História da Ciência pela UNICAMP, Campinas, 1992. É mestre em Saúde Comunitária pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Bahia, 1994. Concluiu o curso básico de inglês da Escola Baiana de Expansão Cultural (EBEC), 1977. Concluiu o curso “Pre-Michigan” da Associação Cultural Brasil-Estados-Unidos (ACBEU), 1979. Concluiu o Curso de Tradução da Associação Cultural Brasil-Estados-Unidos (ACBEU), 1980. Concluiu o Curso Básico de Francês da Alliance Française (CEPAL), 1981. Concluiu o Curso Básico de Alemão do Instituto Cultural Brasil-Alemanha (Instituto Goethe), 2002.
Produção Literária
Arrastão
Durante a greve da polícia militar da Bahia (2012), cerca de vinte homens jovens, todos negros ou quase negros, a maioria sem camisa, vestindo bermudas longas, alguns com bonés virados, outros com colares de metal prateado no pescoço, invadiram um sebo situado no Largo do Porto da Barra, gritando:
– Queremos livros!
Surpreendidos, os proprietários pensaram, a princípio, que os jovens quisessem dinheiro ou objetos de valor material – celulares, computadores, relógios.
Mas não. Eles se dirigiram diretamente às prateleiras e exigiram, aos berros:
– Livros!
Os proprietários imediatamente ofereceram Paulo Coelho e outras obras de auto-ajuda, além de O Código da Vinci, Harry Potter, O Crepúsculo e livros nos quais belos adolescentes são magicamente felizes, sem qualquer vínculo com a realidade adulta.
Mas os invasores os recusaram. Continuaram, violentamente, desesperadamente, a retirar livros das prateleiras e a lançá-los ao chão.
Apreensivos quanto às conseqüências, os proprietários, cautelosamente, resolveram subir o nível e, como havia muitas obras de Jorge Amado, em edições baratas, encalhadas, ofereceram-nas ao bando.
Em resposta, receberam palavrões, safanões, tapas e coronhadas.
– Queremos os melhores! Só os melhores!
– Não tentem nos enganar!
Um deles apontou um revólver para um dos proprietários e bradou, ameaçadoramente:
– Onde estão?
Completamente aturdidos e, ao mesmo tempo, dotados de delicada e meticulosa cautela, os proprietários mostraram-lhes Machado de Assis, Guimarães Rosa, Drummond, Cabral, Bandeira, Graciliano Ramos.
Os olhos dos assaltantes brilharam:
– Isso mesmo!
– São esses que queremos!
E avidamente, atabalhoadamente, começaram a colocar os livros em grandes sacos de plásticos que traziam consigo.
Incrédulos, perplexos, os proprietários observaram a cena como se estivessem diante da irrupção do fantástico no cotidiano.
Então os jovens vociferaram, quase em uníssono:
– Os estrangeiros!
– Onde estão os estrangeiros?
Eles estavam muito bem informados; recusaram autores de segunda categoria e exigiram:
– Cervantes, Shakespeare, Dante, Dostoievski, Fernando Pessoa, Joyce, Proust, Thomas Mann…
Os proprietários foram obrigados a oferecer-lhes seus melhores autores; temiam às conseqüências, para sua integridade física, da tentativa de enganá-los com autores menores.
Com os sacos repletos de grandes obras literárias, os jovens apontavam dedos em riste e punhos cerrados para o ar e agora gritavam:
– Filosofia!
– História!
– Antropologia!
– Política!
– Geografia!
Grandes clássicos dessas disciplinas foram-lhes, então, apresentados.
Após cerca de uma hora, os saqueadores, carregando volumes abarrotados de livros, saíram do sebo, rindo alto, comemorando o butim; alguns deram tiros para o alto.
Os proprietários comunicaram imediatamente o ocorrido aos poucos policiais que permaneciam de plantão, que, entretanto, se recusaram a registrar a queixa, por lhes parecer inverossímil. Ameaçaram-lhes de prisão, por tentativa de ridicularizar a polícia.
O delegado riu com sarcasmo zombeteiro:
– Roubar livro, se isso existir, não constitui crime!
Contudo, não se sabe como, a informação sobre o insólito episódio circulou e foi noticiada pela imprensa.
Gerou imediatamente grave preocupação aos governantes e em toda a cúpula do establishment nacional.
O Gabinete de Segurança Institucional reuniu-se de emergência.
A Agência Brasileira de Inteligência convocou, em caráter extraordinário, todos seus agentes.
O Alto Comando do Exército foi alertado.
Editorial de um importante jornal paulista advertiu para “as funestas conseqüências para o equilíbrio e a ordem social caso as massas iletradas, ao tomarem conhecimento de seus direitos, por intermédio de clássicos da literatura universal e das ciências humanas, subitamente passem a reivindicá-los por meios violentos.”
O governo federal e os órgãos de segurança nacional concluíram, após investigação emergencial e sumária, que “intelectuais infiltrados junto aos que não tiveram acesso à educação formal os teriam instruído sobre as obras fundamentais, tanto nacionais quanto estrangeiras, para a formação da consciência sociopolítica e à independência de julgamento.”
O presidente da República, em cadeia nacional de rádio e televisão, fez o seguinte pronunciamento: “Existe considerável risco de que o movimento violento e espontâneo dos intelectualmente excluídos, que se iniciou na Bahia, berço da nacionalidade, estado-mãe da brasilidade, se dissemine pelo território nacional, com graves conseqüências para a ordem pública. Desse modo, o governo federal, em cumprimento de suas obrigações constitucionais, adotará as medidas excepcionais necessárias à manutenção da normalidade social.”
Os serviços de segurança do governo federal e das forças armadas passaram a controlar, de forma velada, as atividades de todos os intelectuais do país. Professores universitários da área de ciências humanas foram vigiados e seguidos; suas correspondências, física e virtual, e a comunicação telefônica, monitoradas sem autorização judicial, impossível de ser obtida, em curto prazo, para milhares de pessoas. Como justificativa, o governo alegou que a situação excepcional exigia medidas excepcionais.
Decreto presidencial determinou que os compradores de livro devessem informar profissão e endereço; esses dados ficariam registrados nas livrarias. O livreiro foi legalmente responsabilizado pelo registro e arquivamento dessas informações. Em casos suspeitos – ou seja, em situações em que o livreiro suspeitasse que o livro destinava-se a pessoas que o utilizariam para fomentar a cizânia social, a desordem pública, esse deveria sustar a venda e informar ao governo os dados do pretenso comprador.
Tentou-se, assim, evitar-se, a todo custo, o contato da turba rústica com os livros.
Embora não tivesse sido oficialmente estabelecido, informalmente instalou-se, no país, uma espécie de estado de sítio, que, na prática, suprimia as garantias constitucionais.
Toda pessoa suspeita de colaborar, de algum modo, com a patuléia, teve seus movimentos controlados e, um eventual contato com os intelectualmente desprovidos, impedido.
Nas portas de cada livraria, de cada biblioteca pública, foram postados guardas armados. A polícia federal, a força de segurança nacional e o exército foram utilizados para impedir que os saques a livros se repetissem.
Os assaltantes do sebo baiano foram implacavelmente caçados pelas forças de segurança e presos; todos os livros roubados, apreendidos.
Com essas medidas, a rebelião popular foi controlada.
Para evitar que o fenômeno se repetisse, as autoridades criaram um programa para a distribuição subsidiada de instrumentos musicais, aparelhos de som e aulas de capoeira à população – o Bolsa Diversão. Shows musicais passaram a ser oferecidos gratuitamente nos bairros periféricos, três vezes por semana, sem controle do volume sonoro. O imposto incidente sobre a cerveja vendida em garrafas grandes foi reduzido em vinte e cinco por cento.
E assim o Brasil continuou a ser o paraíso da alegria vã e leviana – para gáudio dos governantes e dos gringos que nos visitam.
Publicações
- O Discurso do Tempo (Editora 7Letras), 2014 – romance;
- Participação da mesa-redonda: Jorge Amado e a Cultura Baiana, realizada durante a III Feira de Livros de Feira de Santana-BA, 2012;
- Entre os “Bárbaros Filosóficos” (Fundação Pedro Calmon: Instituto Goethe), 2011 - crônica de viagem;
- Participação do Encontro com o Escritor – Edição Especial, Biblioteca Pública do Estado da Bahia, 22 de setembro de 2011;
- Participação do Café Literário da 10ª Bienal do Livro da Bahia para discussão do tema: Literatura e Cotidiano, 2011;
- Palestra proferida na Universidade de Hamburgo, Alemanha, sob o título: Literatura e Processo Criativo, 2010;
- Encontro e discussão com o público, juntamente com o escritor alemão Thomas Meinecke, sobre as Residências Literárias em Hamburgo e Salvador, Instituto Goethe de Salvador – BA, 2010;
- Hermann Hesse: O Guru da Individualidade, jornal A Tarde, 2010;
- Participação na Mesa Redonda como Atividade Educativa no Museu de Arte Moderna da Bahia (MAM), promovida pelo Instituto Goethe de Salvador, 2010;
- Participação da Semana Hermann Hesse, promovida pelo Instituto Cultural Brasil-Alemanha, como coordenador e leitor de textos, 19 a 23 de outubro de 2009;
- A Tampa, Caderno Cultural, jornal A Tarde, 2007 – conto;
- Totalitarismo e Ceticismo, Caderno Cultural, jornal A Tarde, 2008;
- Hoffmann: O Mestre do Fantástico, Caderno Cultural, jornal A Tarde, 2007;
- A Cidade da Bahia na Visão de Ernst Jünger, Caderno Cultural, jornal A Tarde, 2006;
- Os Setenta Anos da Visita de Ernst Jünger à Bahia, siteterramagazine.terra.com.br, 2006;
- Leitura e Refinamento, Caderno Cultural, jornal A Tarde, 2006;
- O Desencanto do Cinema Francês, Caderno Cultural, jornal A Tarde, 2006;
- Contos do Porto da Barra (Editora 7Letras), 2006 – contos;
- Viajar é Preciso?, Caderno Cultural, jornal A Tarde, 2005;
- Revista Cult, nº. 16, 2004 – poema;
- O Prazer de Perceber, Caderno Cultural, jornal A Tarde, 2002;
- Todas as Coisas São Iguais, (Editora Letras da Bahia), 2002 - romance;
- Revista Iararana, nº. 5, 2001 – poema;
- Robert Lowell - Além dos Alpes (Revista Iararana, nº. 2), 1999 - tradução
- Participação na Antologia Poesia Baiana no Século XX, Assis Brasil (org.), (Editora Imago), 1999;
- A Faculdade de Medicina da Bahia na Visão de seus Memorialistas (1854-1924), (Editora da Universidade Federal da Bahia - EDUFBA), 1997 – história
- Participação na Antologia Oitenta (Editora BDA), 1996;
- A Morte de Nina Rodrigues e suas Repercussões, Revista Afro-Ásia nº. 16, Centro de Estudos Orientais (CEAO), 1995;
- Revista Exu, nº 5 (Fundação Casa de Jorge Amado), 1988 – poema;
- Dashiell Hammett - Safra Vermelha (Editora Brasiliense), 1985 – tradução;
- Lawrence Ferlinghetti - Vida sem Fim: As Minhas melhores Poesias (Editora Brasiliense), 1984 - tradução;
- Vagas Obscenidades (Fundação Cultural do Estado da Bahia), 1982 - poesia;
- Participação na Antologia Veia Poética (Editora Vertente), 1981.