Bio
Poeta baiano nascido em Feira de Santana, formado em Medicina-UFBA, especialista em Medicina da Família pela SBMFC, pós-graduado em Psiquiatria e membro fundador do Movimento Pela Vida, projeto que vem prevenindo o suicídio de adolescentes no Povoado de Algodões-BA. Lançou em 2004 seu primeiro livro “A Mar e Outros Verbos” e em 2008 ganhou o Prêmio CDL de Literatura com seu segundo livro de poesia “A Moça Pintada no Tempo e o Eu Indefinido”. Em 2009 ganhou o Troféu Destaque Nas Artes e Letras-MAC na Exposição NÔMADES. Em 2013, seu poema “Café da Manhã” foi selecionado pelo Prêmio Damário Dacruz de poesia, para participar da coletânea “Outros Riscos” da Fundação Pedro Calmon-SecultBA. Em 2015, seu livro “Os Girassóis da Manhã Seguinte e O Canto Do Pássaro Livre” foi premiado no Concurso Internacional da União Brasileira de Escritores e venceu o II Concurso Nacional de Contos da Associação Brasileira de Psiquiatria com seu primeiro livro de contos “Mania de Limpeza e Outras Loucuras Postas Sobre a Mesa”. Ainda em 2015 foi eleito Membro da Academia de Letras e Artes de Feira de Santana e participou do livro Arcos de Mercúrio-Antologia Poética do Tarô. Com o olhar sempre inquieto, vem observando as minúcias do existir e do saber-se homem.
Produção Literária
Travessia
Íntima confirmação de pele
em sóbria confirmação de ventos…
Até aqui o que se fez
foi atirar a pedra
sobre o silêncio das janelas omissas
e zerar pegadas: rótulos de areia
em cariadas ferrovias,
avistando no escuro com dedos de sol
e apontando atrás do muro
o mote das espumas…
Do lado esquerdo do peito
deixo meu trunfo percussivo
e me digo palpitante.
Embaixo dessa manga embutida
trago o coringa que me garantirá eternidades
(minha permanência na próxima cilada)
e em minha mão aberta lê-se:
trem fora dos trilhos
riso fora do rosto
risco dentro do tempo
caminho a ser dito nos mares…
“Doida” Kalú
Doida Kalú sofria de estrabismo de abismos…
Nos seus atritos, sonorizava o sol.
Dizia entender predisposições de abelhas…
Inusitava o breu, agonizando auroras.
Na noite fria prestigiava a lua
Inaugurando gravidades…
Sua maneira de arrepiar vazios ajustava solidões…
Nunca estava sozinha
Tinha sempre um amigo invisível
Para labutar nos ouvidos
Escutando as vozes que só ela ouvia
Com uma teimosa e arriscada atenção.
De repente, quando ouvia o coro:
“DOI-DA KA-LU-Ú”
“DOI-DA KA-LU-Ú”
Saia correndo atrás das crianças
Atirando paus, pedras
Ou qualquer coisa que suas mãos
Enxergassem mais que seus olhos.
É que para ver a realidade
Se atiçava no presente
E, de vez em quando, embaralhava acasos
Rasurando infinitos.
Andava dizendo:
“o olho na parede aumenta precipícios”
“quando fico no escuro, tudo é claridade”
“tenho sede de memória, quando encurto a palavra”
“atrás do muro vedo inconstâncias”
Morreu atropelada
Quando corria enlouquecida
Atrás de um menino que só ela via
Correndo e gritando:
“DOI-DA KA-LU-Ú”
“DOI-DA KA-LU-Ú”
Infância
“Triscou,lambeu”
E os meninos correm pelas ruas
Com suas pipas nas alturas nuas
Temperando a vida cortante
Com o vidro de suas linhas oníricas
Empinando no ar afiado
A breve e eterna vontade de sorrir
Com o vento lambendo pirulitos de seda e alegria
E seus sorrisos cortando a carne do tempo
Com carretéis de felicidade
Que mumificam no céu
O Sudário da infância medida
Entre as bordas do papel
E os limites da talisca.
Tempo
As crianças brincam
No lado de fora da roda do tempo
E inocentam meu silêncio rabiscado
Enquanto giro, miro e ofusco continuidades…
Pulam sobre os ponteiros
Como se estivessem saltando as pedras
No meio do riso que me escapa
Rindo com a seriedade de quem vinga as horas
Extraviando o corpo em sua finitude.
Oscilo… Permaneço sentado
Abusivo em minha inquieta atitude
De me colocar diante da infância(roubada,inventada,vivida)
Para fetalizar o tempo
Imunizando a carne de sua combustão
Violando suas unhas e suas senhas
E quando o faço colete a prova de si mesmo
Coexisto em perenidades…
Soteropolitado
Insisto em ver o mar alto
No asfalto quente das retinas
Com suas evidências salinas
Pelos poros urbanos.
Transpirante , a cidade sincretiza
E espuma suas verdades gasosas
E nos exila atrás das tensas vidraças
E nos isola entre paredes burguesas
Banguelas solidões que se afagam mudas:
Da minha janela indefesa
Manca um sol vadio.
Publicações
- Os Girassóis Da Manhã Seguinte e O Canto Do Pássaro Livre (Prêmio Vicente de Carvalho/Concurso Internacional da União Brasileira de Escritores 2015), 2015;
- Arcos de Mercúrio- Antologia Poética do Tarô (Ed. DiaboA4), 2015;
- Antologia Outros Riscos (Prêmio Damário Dacruz de Poesia/Fundação Pedro Calmon SECULT-BA), 2013;
- A Moça Pintada No Tempo e O Eu Indefinido (Prêmio CDL de Literatura), 2008;
- A Mar e Outros Verbos, 2004.